sábado, 21 de julho de 2012

A NÃO TRADUÇÃO DAS OBRAS DE CHICO XAVIER





Já faz um tempo que eu me desgostei do espiritismo. Não do que se aprende na doutrina, mas na própria idéia de espiritISMO. Passei a achá-la desnecessária, e até mesmo contraproducente. Acredito até que podemos culpar o fracasso do espiritismo ao seu formato. Até hoje, se você é uma pessoa leiga sobre espiritismo, que vai num centro espírita (assustado, desconfiado) com problema espiritual, pode sair de lá apenas com um passe e a recomendação de ler as obras de Kardec. Racionalmente falando é algo bom pro "paciente", afinal a leitura da doutrina é recomendável porque atua no senso crítico da pessoa, mas psicologicamente é de uma ineficiência grosseira. Se a mesma pessoa for num terreiro de umbanda ou numa igreja evangélica vai ter uma acolhida muito, muito mais intensa. E às vezes é só isso de que a pessoa precisa no momento. Espíritas EM GERAL, quanto mais imersos na doutrina, ficam frios, arrogantes (com verniz de humildade, claro) e pouco empáticos. As palestras são enfadonhas e a linguagem de 50 anos atrás é mais enfadonha ainda. Claro que existem as exceções, e palestrantes espíritas que são divertidos, didáticos e empáticos. Esses fazem sucesso Brasil afora fazendo palestras, mas não podem sustentar sozinhos o entusiasmo das pessoas pelo espiritISMO.
 
Pra mim os verdadeiros espíritas permanecem invisíveis, mesclados na sociedade, ajudando ostensivamente em asilos, ONGs, hospitais e (por que não?) centros espíritas. Mas eles não estão trabalhando debaixo de alguma bandeira, dependendo de um formato, um ISMO (e essa é minha crítica, quanto ao ISMO). A doutrina é muito maior que isso, pois se baseia no cristianISMO (que também é muito maior que isso), que se baseia nos ensinamentos de um cara que foi maior que a Vida.

Eu participava há anos da lista espiritismo-br, mas saí de lá desgostoso, pois não havia DESENVOLVIMENTO do espiritismo, não era uma coisa em expansão. Não havia diálogo, idéias novas, apenas MOFO. Até que um cara apareceu e chutou o pau podre da barraca, que foi o Alamar Régis. A carta aberta dele ao Presidente da Federação Espírita Brasileira (FEB) sintetizou tudo o que eu estava experienciando ali, e pior: mostrou COMO os espíritas das mais diversas épocas, que tentaram desenvolver a doutrina, foram tratados pelos "espíritas" e pela Federação Espírita. Chico Xavier incluso. Não há um interesse em fazer uma espécie Livro dos Espíritos 2.0, aproveitando-se da internet pra recolher perguntas e respostas em escala planetária! Até onde sei as palavras de Kardec e dos espíritos não são sagradas, nem devem ser tomadas como dogmas. Como tudo na vida é questão de interpretação e mentalidade da época. Até mesmo para os mais fervorosos evangélicos é um pouco demais fazer holocausto de carneiro pra Deus, porque eles sabem que as tradições mudam com a mentalidade da época! Por que raios temos de calcificar nossa mente no século 19?

Agora vi mais um texto do Alamar. Transcrevo-o logo abaixo. Pra mim é a pá de cal na estrutura que engessa o "movimento" espírita há décadas. Mostra que Chico Xavier foi procurado por empresários norte-americanos pra publicar seus livros em inglês. E a FEB, que detinha o direito sobre os livros PORQUE CHICO DEU A ELES DE GRAÇA, não autorizou. Não tenho dúvida que, SE Chico Xavier fosse norte-americano, teria gente do mundo todo fazendo romarias aos EUA, como fazem os fãs de Elvis, que estaríamos devorando os livros dele como fazemos com Harry Potter e o Senhor dos Anéis, teríamos os mais diversos filmes (e BONS filmes) feito a partir dos livros. Sem falar nos documentários e toda a promoção em torno da imagem dele que os norte-americanos são mestres em fazer. E talvez por isso mesmo Chico Xavier não nasceu lá, e sim no interior de Minas Gerais, feio, inseguro, simples. Mas uma coisa é certa: mesmo esse "capiau" sonhava em ver a doutrina florescer, ganhar o mundo. Não por ELE, mas pela MENSAGEM, pelo conforto que traz às almas das pessoas, e pra isso ele escreveu, e muito. Não sob a bandeira de um ISMO. Ele não nos trouxe uma codificação. Trouxe novelas (os romances), trouxe mensagens de parentes desencarnados, trouxe ânimo, trouxe consolo. Nada dos textos que ele trouxe constitui A doutrina, mas a doutrina está dentro dos textos, na linguagem e para as pessoas do SEU tempo, no formato do SEU tempo. E Chico se foi. O tempo passou.

Qual o formato do NOSSO tempo?

Por Alamar Régis:

Em 1991, numa viagem que fiz a São Paulo, como sempre fazia, fui à Federação Espírita do Estado de São Paulo, FEESP, naquele prédio da Rua Santo Amaro, na Bela Vista. Chegando lá fui procurar conhecer o pessoal da divulgação, os que faziam o "Jornal Espírita" e "O Semeador", respectivamente João Gianini Pascale e Altamirando Carneiro que me apresentaram a outras pessoas da diretoria, que manifestavam uma certa alegria em me conhecer, já que o meu nome ali não era estranho, porque eu me tornara conhecido pelos jornais espíritas, por causa do programa da Embratel. Dentre estas pessoas, fui levado à sala do presidente, senhor Teodoro Lausi Sacco, que me recebeu com uma deferência muito especial logo no primeiro dia.

 No terceiro dia que fui lá, ao chegar, encontrei logo de cara com o presidente, Lausi, que parecia já estar me esperando, conduzindo-me à sua sala para uma conversa, segundo ele, "muito importante" e séria. Ele se dirigiu ao cofre antigo, abriu, retirou algumas pastas com vários papéis dentro, colocou sobre a mesa, sentou-se e disse:
- "Alamar, não sei porque, mas eu tenho que mostrar isto aqui para um espírita dinâmico, corajoso e destemido que pode, talvez, um dia reverter este quadro e recuperar algo de muito precioso que o Espiritismo perdeu. Anteontem, quando você estava aqui nesta sala, trazido pelo Altamirando, alguma coisa me disse que esta pessoa seria você. Preste bem atenção na história que vou lhe contar.”

E começou a contar-me uma história, mostrando-me os papéis correspondentes a cada ponto que ele abordava. A história é a seguinte:

Consta que no início de abril do ano de 1969, veio ao Brasil um grupo de empresários americanos, de uma megaeditora dos Estados Unidos, para ter um encontro com o Chico Xavier, objetivando informá-lo que eles queriam traduzir todos os seus livros para o inglês, além de todos os outros livros espíritas que ele recomendasse, editá-los nos Estados Unidos e lançar as obras no mundo inteiro. Queriam saber se ele concordava com a idéia e se autorizaria.

Ao fazerem a proposta em Uberaba, o Chico emocionou-se tanto e deu mil graças a Deus por aquilo que ele chamou de "uma bênção".
- "Claro, meus irmãos, que eu concordo! Quanta alegria vocês me trazem, como um verdadeiro presente de aniversário! Isto é uma bênção, mas acontece que os direitos das obras foram todos doados à Federação Espírita Brasileira, que certamente autorizará.”

Consta que o velho mineiro ficou tão feliz, os convidou para almoçar, eles ficaram três dias em Uberaba, conheceram os trabalhos e um deles até recebeu uma mensagem psicografada, em inglês, de um parente desencarnado. De lá os homens partiram para Belo Horizonte e em seguida para Brasília, para um encontro com a diretoria da FEB. A reunião aconteceu, a proposta foi feita à então diretoria e, pasmem senhoras e senhores, vejam a resposta:

- "Nós não autorizamos. O problema de tradução é muito sério, vocês vão adulterar as obras e o prejuízo para o Espiritismo vai ser muito grande. Lamentamos, mas não autorizamos.”

De fato, não restam dúvidas de que a tradução de obras literárias de um idioma para outro geralmente causa problemas sérios de interpretação de orações, porque os tradutores não podem se limitar apenas a traduzirem as frases como elas aparecem, mesmo com as colocações verbais e gramaticais corretas, porque existe um fator indispensável a considerar que é "como as pessoas do País de origem da língua da obra entendem determinada frase ou determinada colocação". Este é um problema muito sério e, por incrível que pareça, até mesmo em traduções das obras básicas, do Francês para o Português, existem contradições ao pensamento de Allan Kardec e aos pensamentos dos Espíritos, conforme está no original. As traduções da Bíblia, por exemplo, trazem absurdos terríveis, por causa disto. Mas não é esta a questão que estamos analisando agora.

Concordando com a preocupação da FEB, pertinente com certeza, os editores americanos propuseram o seguinte:

 - "Então os senhores indicam uma equipe de tradutores juramentados para acompanharem todo o trabalho de tradução, que nós bancamos todas as despesas e honorários. Só publicaremos cada obra, após o de acordo da FEB, para manter a integridade da mesma.”

Mesmo assim a FEB não autorizou.
 
Consta que os homens ficaram uma semana em Brasília, voltando lá diversas vezes, solicitando serem atendidos, foram atendidos apenas uma vez, do lado de fora, com todos em pé, e não mais foram recebidos, quando ouviram um funcionário lhes transmitir um recado da diretoria que dizia que o assunto estava encerrado. Consta que o Chico estava num clima parecido de "lua de mel", tamanha a sua felicidade, com aquela nova ideia, que só poderia ser trabalho da espiritualidade maior, até que lhe veio a notícia:

A FEB NÃO AUTORIZOU!

Quase o Chico desencarna quando soube daquilo. Custou a acreditar no que estava ouvindo. Tentou falar com alguém da diretoria da FEB, mas consta que não encontrou ninguém que pudesse atendê-lo para falar sobre o assunto. O notável médium entrou num processo de ira tão grande, chegando a passar mal e até a ser levado a um hospital. A partir daí decidiu a nunca mais doar os direitos e muito menos autorizar que a FEB publicasse qualquer livro escrito sob a sua psicografia.

Se todos procurarem checar o assunto e observarem a relação de livros psicografados pelo Chico, notará que, de fato, a partir de uma determinada época não consta mais livro nenhum do Chico editado pela FEB. Existem alguns livros editados, inclusive no ano de 1971, pela FEB, que são, se não me engano, o "Rumo Certo", que é um livro de mensagens do Emmanuel, e o "Antologia da Espiritualidade", um livro de poesias de Maria Dolores. Acontece que o Chico havia doado esses direitos antes do acontecido, já que nem sempre os livros eram publicados no ano que o direito foi cedido. A partir daí, podem observar, os livros começaram a ser editados apenas pelas editoras Clarim, CEC, Edicel, GEEM, FEESP, IDE, LAKE, CEU etc.

No ano de 1992, voltando a São Paulo, já amigo do Teodoro Lausi Sacco, voltei à FEESP para conversar sobre o assunto, indignado ainda com aquilo, e lhe pedi maiores detalhes e informações sobre o acontecido. Ele me disse que pouca gente, do movimento espírita, sabia daquilo e que a lembrança do fato fazia o Chico muito triste. Eu já tinha uma certa amizade com o Nestor João Masotti, que hoje é presidente da FEB mas na época (1992) era um dos seus vice-presidentes (a FEB tem mais de um vice-presidente). Ele sempre me tratou muito bem, com muita atenção... aliás, o Nestor sempre trata bem a todo mundo, é um "gentleman", um espírita do mais alto nível, um homem digno de estar onde está hoje. Não é um espírita de rótulo. Do aeroporto fui direto à FEB e começamos a conversar a respeito do fato. Eu imaginava que o Nestor soubesse daquilo, por ser um espírita muito influente no País e até no exterior, inclusive ex-presidente da USE (União das Sociedades Espíritas do Estado de São Paulo). Hoje ele é presidente do Conselho Espírita Internacional. Cheguei até a perguntar a mim mesmo: "Puxa vida, como é que pode, o Nestor um homem de São Paulo, atuante no movimento espírita paulista, não saber disto que me foi informado pelo presidente da FEESP, também grande nome do espiritismo paulista?". Mas são coisas da vida, ou melhor, coisas de movimento espírita.

Conversamos muito, relatei para ele tudo o que o Lausi Sacco havia me dito e ele manifestou-se surpreso com a notícia. De volta ao seu gabinete o Nestor me disse que iria procurar ver se existiam registros acerca do fato nos livros de atas da FEB, arquivados desde a sua fundação. Entraria em contato comigo e me diria alguma coisa, caso existisse ou caso não existisse nada registrado. Um mês depois, mais ou menos, ele me ligou para Belém e me disse o seguinte:

 - "De fato o episódio aconteceu. Há registros, sim. Mas aconteceu em uma época em que a FEB atravessou um dos momentos mais difíceis da sua história, momento este em que quase houve um rompimento até mesmo com as federativas estaduais...”

Na oportunidade questionamos, eu e ele:

- "Que tal a idéia de tentarmos descobrir quem são essas editoras americanas hoje, esses homens e vermos se eles ainda existem e estão dispostos a darem continuidade à idéia”.

Pela cabeça do Nestor Masotti, tenho certeza de que uma idéia desta jamais seria reprovada. Mas será que todos os outros dirigentes espíritas, mesmo os atuais, pensariam como ele?

Será que, pela coisa ser grande demais, não seria reprovada mais uma vez pelos espíritas donos da "pureza" doutrinária que, em nome da "humildade", continuam a reprovar tudo o que é grande, na concepção equivocada de que pelo Espiritismo só se podem fazer coisas pequenas? Será que a pessoa espírita brasileira, indicada para acompanhar os americanos no processo das traduções, pessoa esta que certamente seria bem remunerada, obviamente pelas poderosas editoras, não seria acusada de ganhar dinheiro às custas do Espiritismo?

Fica aí a história para a reflexão de todos.

Texto de Acid - www.saindodamatrix.com

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